a deusa fogo

vagueou no espaço limitado do vento e sentiu no rosto a prisão agreste .pensou que poderia percorrer outros sinais ,desde que os signos lhe demonstrassem que errara na escolha do deus .Hades fora a estátua que esculpira pela manhã ,enquanto lhe corriam os pensamentos soltos .insistentemente ,Hélios circulava entre os aros dos óculos que havia pousado na cadeira pejada de jornais da véspera e

a pedra soltou.se da primeira página ,projectada na face negra da lua .sentia.se acordado no espaço lúgubre da passagem .era noite .sabia.o .sentia.a .tinha.o .desejava.a .sua .seu .o egoísmo ,porém ,aquecia.os na letargia do quarto ,deitados ao cuidado dos dedos e das mãos ,sôfregas .os corpos ,embalados pelo vento ,percorriam as esferas húmidas do prazer ,longe dos lugares inimaginados ,onde ,em cada segundo ,sucumbia um ser humano .eles haviam.se como os repovoadores do mundo .os obreiros da casta de uva que ,de madura ,havia de pender sobre o solo .bocas sedentas abriam.se ao recolher os bagos ,e eles amavam.se ao sabor da parra

o espelho deixava.lhe o reflexo do vento .sabia.o desde que havia aberto a porta do escritório à espera de uma nova rajada .deixava.se envolver e rodopiava ,qual bailarina ,em folha solta .as hastes do cedro dourado rumorejavam e ,no quebranto da dança ,ela deixava.se levar pelo vento peregrino .sentia.se na revolta de si ,ou talvez não .no momento em que ele lhe havia descrito a conversa a três .na altura irritara.se ,mas agora ,olhava a indiferença marcada na sua pele .era ,mais uma vez ,uma tentativa falhada ,de regresso a um passado que rejeitava ,porque não seu .era ela sem o ser ,e rótulos ,jamais permitiria a alguém .todavia ,curioso! já não estava irritada .a importância relativa dos outros deixava.a entregue ,de novo ,ao bailado do vento .aquele medo/fascínio ,aquele ser/não sendo ,aquele colocar/tirar a máscara ... ah! aí sim .era ela .máscara grega .a pitonisa .a vestal .a deusa .ela e o fascínio da queda .mas .merda para tanto EU .ela dançava nua no vento e ria.se demais .louca

a imagem reflectida ... o balanço do corpo .a lágrima que o vento abrigava na face .o uivo .o homem .o canto chão alentejano .o encontro na noite .inventado .enroscava.se no silêncio do sofá qual felino em espera .viriam .tinha a certeza .quem? a imagem .o reflexo .o desequilíbrio .a palavra .o certo .o errado .o logro . a verdade .a confusão .o medo .a revolta .a falta de afecto .os seus fantasmas ( era demasiado idiota para acreditar neles ) .tudo não passava de uma farsa deixada à fantasia dos seus autores .mas os autores eram eles .eles ,os reais participantes da vida que iria arrastá.los aos infernos .Dante .um cheiro a enxofre percorreu.lhe as narinas ,ávidas de viver .o percurso era outro .a diva .a maior .ele o ser superior .encontravam.se na lava ,envoltos em espirais de vento .iriam ,no entanto, resistir ao temporal .ao temporal dual .o dos outros pouco ou nada interessava .o irresistível toque do telemóvel .olhou o visor .anónimo .a atracção do abismo era superior a ele .conhecia o/a anónimo/a .outra .mas ... atenderia .gostava daquele jogo em ser .sado.masoquista

porque não? as mulheres haviam de ter ,na sua vida ,o papel que encenara .e havia.o feito com tal perfeição ,que já não era capaz de distinguir o real do imaginado .transformara.se no redopio das folhas caídas .arrancadas .pelo vento .queria sentir fúria .queria rasgar o útero .queria.se mulher de arranhar e/ou deixar as suas unhas cravadas em outras costas .queria .simplesmente deixar.se envolver na melodia do ventre
e dormir o momento .o entregar.se .o achar.se .o despir.se .o ser
sol .o palhaço de luz sorriu.lhe .louca ,despiu.se em slow.motion .vestiu o casaco .colocou o cachecol à volta do pescoço e foi .ao encontro .cheirava ,no entanto ,a enxofre ... os seus passos enquadravam.se na matança .finalmente ,o climax .o orgasmo final .hades e a deusa
fogo
acabou a tragicomédia
por favor .chamem os bombeiros!
gabriela rocha martins
fotografias de Silvestre Raposo ( retiradas do flickr ).

Pintura de Silvestre Raposo na Casa Museu João de Deus ,em S. Bartolomeu de Messines





Silvestre Luís Varela Raposo nasceu em Vila Nova de S. Bento - Serpa.
É licenciado em Artes Plásticas Pintura, pela Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa.
Professor de Design Gráfico na Pós Graduação do INUAF - Instituto Universitário Dom Afonso III em Loulé.
Foi membro do Conselho Pedagógico da Faculdade e da Assembleia Geral da Universidade Clássica de Lisboa.
Foi director da Galerias Municipais de Arte em Moura e Mourão, onde organizou e dirigiu mais de 80 Exposições.
Professor em vários Cursos Livres de Arte, nas áreas de Pintura, Desenho, Fotografia e Audio Visuais. Formador pelo IEFP, tem participado em Formações, nas áreas de História de Arte, Sociologia da Arte, Desenho e na Formação Pedagógica de Formadores.
Autor de poemas editados nos Vol. XI e XIII da Antologia "Poiesis" da Editorial Minerva de Lisboa. Autor de Contos nas Colectâneas "Laços de Palavras" e "Inquietação" da Editorial Minerva - Lisboa.
Autor do livro de poemas sob o título "Nas Margens do Sonho" com prefácio de Urbano Tavares Rodrigues e introdução de Sérgio Sá.
Autor do livro de Fotografia "Moura - Contrastes de luz".
Autor do Livro de Poemas "Caminhos de terra e mar" editado por Taller del Poeta, em Espanha - Galiza - Pontevedra.
Autor de ensaio, em fase de acabamento, sobre Estudos de Arte e Sociologia da Arte, onde aborda problemáticas das leituras e linguagens da comunicação, na Arte Contemporânea. É ainda autor, como crítico, de textos sobre obras de arte e obras literárias, em várias páginas web e jornais.
Membro da Académie Européenne des Arts - Secção de Portuguesa, Sócio da Associação Portuguesa de Poetas, da Associação Cultural Cuid'Arte e do Grupo 90. É autor de inúmeros Trabalhos de Pintura, Fotografia, Design e algumas Esculturas, de onde se destacam - o Painel de Pintura do Serviço de Finanças de Mourão, as telas da Caixa Agrícola de Aljustrel, as peças escultóricas dos "Prémios Salúquia às Artes" da Câmara Municipal de Moura e do "Prémio ao Melhor Aluno" do Instituto Universitário Dom Afonso III de Loulé, bem como, vários Logotipos e algumas capas e ilustrações em livros.
Galardoado com alguns prémios em Fotografia, Artes Plásticas e Design, participou em mais de 90 exposições individuais e colectivas...
sobre a sua obra ...
Da Poesia, em "Nas Margens do Sonho", diz Urbano Tavares Rodrigues
... poesia, por vezes diarial, simples registo de pensamento e emoções, que tem o mérito de embelezar a vida de quem produz como derivativo do quotidiano e comunica com os muitos cúmplices desse prazer... que nos fala apaixonadamente de liberdade e amor da fome e sede de muitas coisas... e por tudo aqui deixo afectuoso testemunho em sintonia com a sua mensagem.
E diz Sérgio Sá
... o poema não é um acto diletante nem um acaso mero... é resultado de um saber próprio acumulado e da acção do seu pensamento.
Silvestre Raposo é Homem que pensa e sente e em consequência sofre como todos os poetas... como deixa transparecer... mas onde renasce também a esperança... que leva o poeta a acreditar na utopia... sonho a que alude com frequência, parecendo confiar na "certeza" de António Gedeão e fá-lo na sua liberdade... com versos de notória singeleza desprovidos de retórica que rejeitam a rima rebuscada... e não deixam estas páginas de envolver... o desejo... de que aqueles que ainda acreditam... se apercebam de que não estamos sós.
Sobre os seus Poemas e Fotos diz Ylia Kasama
... he visto tu arte en tu blog; poesias, fotografias... mas es una alegría conocerte a través de tu trabajo, de tu creatividad, de lo profundo y sensible que escribes. Me han gustado tus poemas y las imágenes, son de verdad hermosas. Todos tus poemas son intensos, me han hecho vibrar, Testamento me ha tocado el corazón.
...,sino que haces poesía con las fotografias ... Esos juegos de luces en tus fotografias son todo un poema. Me encanta la fotografia... siento que cuando uno fotografia algo, no es lo físico, sino lo que uno desea. Es "Hacer infinita la esencia de lo que se ve" con los ojos del alma y tus fotografias son eso... Gratias por tu arte... y de los "Poetas, Poemas e Sonhos" queda que "Al fin y al cabo el amor es más largo que un beso y la libertad del escrito es sólo viento".
Catálogo da Exposição "Blogues" - de 8 a 31 de Março de 2007
Design e Composição: Silvestre Raposo
Impressão: Câmara Municipal de Silves
Imagem da Capa: D. Quixote e o seu escudeiro Sancho.
grm

Comemorações do 177º aniversário de João de Deus - 8 de Março de 2007 - Silvestre Raposo




Trazer a Exposição "Blogues" de Silvestre Raposo ao Concelho de Silves e à Casa Museu João de Deus e, integrá-la nas Comemorações do 177º aniversário do nascimento do poeta/pedagogo João de Deus constituiu, para nós, um acto de confiança na diferença, na medida em que o Autor, também ele, poeta da palavra e dos pincéis, procura, nas suas telas, uma forma muito peculiar de comunicar com os Amigos, inicialmente virtuais, para, no momento seguinte, seduzi-los no prazer cúmplice da sua/nossa vivência quotidiana.
Daí o nome da presente Exposição "Blogues".
Silvestre Raposo trabalha de uma forma muito simples e muito autêntica, mas, simultaneamente, muito sofrida, resultado de um saber, há muito acumulado. É o seu estar na vida.
Com a presente Exposição, o esteta da Palavra pintada procura transmitir, de uma forma lúdica, a sua sensibilidade criativa, e nós, Câmara Municipal de Silves, ao expô-lo, envolvemo-nos, em sintonia, na aventura colectiva de testemunhar um novo modelo de viver a Arte
gabriela rocha martins.

 
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A arte é um antidestino - André Malraux